crédito da imagem banco: L’avion Rose Deco

Essa história não é sobre um banco tradicional, que movimenta valores financeiros, se é esse tipo de banco que veio em sua mente quando lestes o título desse texto.

Esse banco é diferente, pois é um banco onde são depositados materiais de descarte e o resultado do trabalho feito por eles rende novas profissões e a esperança de uma vida melhor para as pessoas que passam por lá.

Apresento a realidade do Banco do Vestuário de Caxias do Sul, e se você, assim como eu, não conhece nada sobre esse assunto, te convido a investir alguns minutinhos nessa leitura e garanto que ganharás no mínimo uma boa história para o seu repertório de aprendizado.

Quando criança eu passava muito tempo na companhia dos meus avós. Me recordo de ficar durante as tardes na sala de costura com a minha avó paterna e usando retalhos de tecido, confeccionar laços para usar no cabelo. Eu organizava tudo em uma caixa de sapatos e enquanto fazia cada tope, pensava o quanto realizar esse trabalho me deixava feliz e já me imaginava uma empreendedora de sucesso, pois naquela época não existiam tantas lojas que vendiam esse tipo de produto como existem hoje.

Confeccionar até que era fácil, bastava um corte bem feito no tecido, uma dobra cuidadosa e uma fita que combinasse para amarrar. Investi em produzir, já que com a prática fui ficando boa. Eu fazia cada vez mais em menos tempo, harmonizava cada vez melhor as cores e evitava cometer erros recorrentes. Minha produção ficava tão bonita que eu acabava querendo ficar com todas as peças para mim e pensava que a parte mais difícil seria produzir, me enganei. Não vendi sequer um da minha produção. Eu achava bonito, mas tinha vergonha de oferecer às minhas amigas. Ficava com receio de que elas achassem simples demais, caro demais, ou que não gostassem tanto quanto eu gostava. Sabia como tinha sido demorado fazer aquelas peças e tive vergonha de que não valesse tanto assim o esforço que tive, então nem me arrisquei em oferecer para alguém.

Foi uma história meio triste eu sei, mas foi algo que lembrei recentemente quando estive visitando o Banco do Vestuário de Caxias do Sul. Essa lembrança fez todo o sentido e descobri um trabalho fantástico sendo feito bem pertinho de mim e que eu não sabia como funcionava. O pessoal do Banco entrou em contato com o GT Responsabilidade Social do Trino Polo com algumas demandas específicas, e então fiz uma visita para entender o público que frequenta o banco e assim reunir informações para:

1º Organizar uma palestra que ajudasse essas pessoas a fazerem um currículo de qualidade e também, ajudá-los a estarem preparados para entrevistas de emprego, já que este é o motivo pelo qual as pessoas participam das capacitações do Banco.
2º Pensar em uma forma de melhorar o processo de venda da sua produção, já que eles só vendem no boca a boca e cada um por si, e tenho certeza que a tecnologia pode ser uma grande aliada para eles venderem mais e assim por diante.

Conferi o trabalho deles de perto e o capricho, as combinações, e o dom de transformar lixo em arte está presente em todos os cantos daquele lugar. Conversando com a Daniela Maino, que é Gerente de Geração de Trabalho, Emprego e Renda aprendi bastante sobre essa entidade e divulgar as atividades deles pode ajudar muita gente.

A sede deles fica em um pavilhão gigante. Existe uma montanha de tecidos abastecida diariamente por toneladas de materiais que são descartados por confecções da cidade e que acabariam virando lixo, mas são transformados na única fonte de renda das pessoas que os utilizam. Nesse material doado estão retalhos de tecidos, elásticos, botões, aviamentos e até mesmo rolos de sobras de tecidos que não serão mais utilizados.

A iniciativa é da Prefeitura de Caxias do Sul e tem um comitê gestor composto por 7 entidades: UCS, APL da Moda, Sindvest, SDETE, CODECA, FAS, Fitemasul e Fundação Caxias. Possuem mais de 100 (cem) entidades que recebem as doações produzidas pelos alunos do banco. São ministrados cursos de corte e costura gratuitos que acontecem diariamente por 2 meses. O público alvo para estes cursos são pessoas (homens e mulheres) de 18 à 40 anos, e o objetivo principal é ensinar uma profissão partindo do básico, formando mão de obra de qualidade para as confecções (a professora é patrocinada pelo Senai).

Na última turma tiveram em torno de 250 inscrições para 40 vagas. É feito um processo de seleção pensando em conceder as vagas às pessoas que demonstrem interesse e disponibilidade para fazer o curso do início ao fim. Também tem curso de modelagem, para quem já fez o curso de costura, esse também é gratuito e é destinado para ex-alunas com interesse (patrocinado pela Unimed). Há oficinas de artesanato e do vestuário gratuitas, em média cinco oficinas mensais, confecção de bonecas, bolsas, patchwork, bordados, enfeites de páscoa e de Natal e noções básicas de costura.

Como muitas alunas não tem sua própria máquina de costura, em uma parceria com a ONG Moradia e Cidadania da Caixa são disponibilizadas máquinas que podem ser usadas pelas alunas para sua própria produção. Em meio turno elas produzem encomendas que são destinadas para entidades que fazem pedidos (lençóis, roupas infantis para crianças das Casa Lar, entre outros) e no outro turno podem produzir para si, e confeccionar suas próprias encomendas. Pessoas que tem registro de artesão podem retirar 50 Kg de tecidos periodicamente gratuitamente para usar em suas produções. Todas estas atividades utilizam os materiais recebidos das doações das confecções.

Como esse assunto é uma informação nova para mim, fui pesquisar e encontrei leituras que dão um panorama do tamanho deste problema no mundo.

“Toneladas de tecidos são descartadas anualmente ao redor do mundo. São erros de produção, sobras e estoques que acabam virando lixo e contaminando o meio ambiente, 10% de toda produção têxtil vira descarte. Essa sobra fica armazenada por anos em estoques ou vai parar no aterro sanitário. O problema se agrava porque 70% do material produzido no mundo é composto de fibras sintéticas e leva dezenas de anos para se decompor. O panorama do reaproveitamento e reciclagem de resíduo têxtil é restrito, por conta de uma série de dificuldades em realizar este processo. Sendo assim, o descarte ainda é a preferência de muitos para lidar com as sobras. Porém uma grande parte do que é descartado poderia ter uma sobrevida.”

É muito bom ver que já existem vários outros bancos de tecido em plena atividade no nosso país, e também empresas como a AGAMA que apostam na moda inclusiva, com a fabricação totalmente provinda de materiais descartados.

Na visita ao Banco do Vestuário de Caxias do Sul, me senti de volta ao passado assim como comentei logo acima, cercada de tecidos, máquinas de costura, pessoas felizes produzindo e com muita incerteza de como fazer isso virar dinheiro. Elas produzem com muito amor, mas diariamente se sentem confusas achando que seu produto pode ser considerado caro demais, simples demais, e que as pessoas não valorizarão todo o empenho que elas dedicaram.

Como a nossa missão número um era ajudar os alunos a conseguirem trabalho, pedi um Help para uma expert nesse assunto, minha colega Cláudia Betiol, psicóloga e especialista em Gestão de Pessoas e que além de ótima profissional é uma pessoa fenomenal. Ela se dispôs a fazer a palestra e montou um material com várias dicas que podem ser úteis para quem está vivendo esse momento de incerteza, e como a Cláudia conhece muito o outro lado, (normalmente somos quem seleciona os profissionais para trabalharem nos nossos clientes) essas dicas são valiosas.

Algumas são bem simples, mas valem para qualquer entrevista de seleção:

 

 

Após a palestra tivemos um retorno muito positivo das participantes. Aprendemos muito com essa experiência e foi uma oportunidade preciosa de conhecer um serviço que precisa de ajuda na sua divulgação. Como as turmas acontecem periodicamente, nos comprometemos em realizar esta palestra gratuitamente para as próximas turmas, pois acreditamos que compartilhando um pouquinho sobre o que conhecemos contribuímos para a evolução das pessoas e do ambiente que nos cerca.

A segunda etapa (melhorar o processo de vendas das alunas) ainda está sendo analisada. Você também pode colaborar com a sua ideia ou sugestão de cases parecidos que sejam de seu conhecimento para que adaptemos ao negócio deles e assim juntos, possamos abrir mais caminhos para esse pessoal tão dedicado aos trabalhos manuais.

Fontes:

Banco do Vestuário de Caxias do Sul – (54) 3901.1457

http://bancodetecido.com.br/sobre

A partir de tecidos que seriam descartados, a Agama faz bolsas e mostra que a moda pode ser mais inclusiva


https://caxias.rs.gov.br/2018/04/banco-do-vestuario-promove-palestra-com-dicas-para-elaboracao-de-curriculos