O maior erro não é perder o emprego para a tecnologia: é perder a relevância antes mesmo de perceber que o filtro já te alcançou. E isso está acontecendo agora!

Mudanças sempre houveram. Mas mudanças tão abruptas, velozes e inusitadas como as que estamos vivenciando, nunca experimentamos, sequer os nossos avós. Há pouco tempo, a maior preocupação de um profissional era bater metas, conquistar promoções e garantir um lugar seguro na empresa.

Hoje o cenário mudou. O “lugar seguro” praticamente não existe mais. As mudanças foram se acentuando de tal forma nos últimos anos que, em muitos casos, é necessário dar um passo para trás, e repensar completamente a sua carreira. E não pretendemos aqui gerar nenhum pavor em nossos leitores, sequer ventilar a ideia de que todos perderemos nossas funções ou atividades profissionais – e consequente renda. Não se trata disso. O que desejamos é indicar alguns alertas e, quem sabe, apontar alguns caminhos e, principalmente, formas de pensar sobre o que está acontecendo no ambiente de trabalho.

Não importa o setor ou o nível hierárquico – de cargos operacionais a posições de diretoria – todos estão expostos a um mesmo fenômeno: a rápida substituição ou reinvenção de funções causada pela inteligência artificial e pelas novas tecnologias.

O filtro profissional que estamos vivendo não se apresenta formalmente, como um comunicado de demissão ou num corte determinado pelo RH. Ele começa aos poucos: tarefas que antes exigiam dias agora são resolvidas em minutos por um algoritmo; decisões estratégicas passam a ser guiadas por sistemas preditivos; equipes inteiras perdem relevância sem sequer perceber que o jogo mudou.

E, quando se dão conta, o filtro já separou quem se adaptou de quem ficou para trás.

Mais do que uma mudança de função, uma mudança de consciência… E de percepção sobre o próprio trabalho. Se antes as ameaças vinham de crises econômicas ou reestruturações organizacionais, hoje o risco é difuso, constante e, muitas vezes, imperceptível. 

As tecnologias estão impondo um processo de triagem diferente do que estamos habituados que está redefinindo o valor de cada cargo e o papel de cada profissional:

  • Automação de tarefas repetitivas elimina funções operacionais.
  • Ferramentas de IA generativa reduzem a demanda por profissionais intermediários.
  • Integrações sistêmicas substituem departamentos inteiros que antes existiam para “ligar pontos” manualmente.
  • Algoritmos de performance aumentam a pressão, criando um funil de produtividade onde apenas os mais adaptáveis prosperam.

O resultado? Cargos que pareciam intocáveis tornam-se irrelevantes em questão de meses.
E isso vai muito além de manter um emprego, exige mudar a forma como percebemos o nosso próprio valor e como nos posicionamos para continuar relevantes. E, claro, do ponto de vista empresarial, sobrevivência, competitividade e velocidade de adaptação. Um movimento sem volta, e que já está em curso.

Peter Drucker foi professor, consultor e autor de uma vasta e valiosa bibliografia de conceitos e ideias fundamentais, sendo considerado o pai da administração moderna. Atravessou duas Guerras mundiais, crises de mercado profundas e a ascensão de corporações globais. Defendia que gestão não é apenas sobre negócios, mas sobre pessoas, propósito e impacto social. Um precursor que anteviu, mas não chegou a viver as transformações que estamos experimentando na atualidade.

Entre os conceitos que desenvolveu, está o de que o primeiro passo para inovar é livrar-se sistematicamente do que não funciona mais, por meio do pensamento “planned abandonment”, que, em tradução literal, significa “abandono planejado”. Acreditamos que esta célebre ideia se aplica com precisão ao momento que vivemos hoje. 

Para escapar do filtro

A má notícia: ninguém está totalmente protegido.

A boa notícia: há caminhos para se blindar e até ganhar vantagem competitiva nesse novo cenário. A seguir, quatro estratégias para não apenas sobreviver, mas se destacar no filtro tecnológico.

1. Reconheça Suas Vantagens Humanas

A IA é brilhante com dados, mas ainda carece de julgamento contextual, criatividade genuína, empatia e capacidade de negociação complexa.

Relembre e liste situações em que suas decisões dependeram de sutileza, intuição ou influência interpessoal.

Esses são os espaços que a máquina ainda não ocupa, e que você pode ampliar.

Ação prática:

  • Invista em comunicação interpessoal, desenvolva melhor suas capacidades de liderança e habilidades de tomada de decisão que envolvam múltiplas variáveis humanas.

2. Mantenha o Radar Tecnológico Ligado

O maior erro de quem teme ser substituído por tecnologia é ignorá-la.
A realidade é simples: quem entende a ferramenta, controla a ferramenta.
Quanto mais cedo você dominar as aplicações relevantes da IA no seu setor, mais difícil será ser filtrado por ela.

Ação prática:

  • Teste ferramentas emergentes.
  • Entenda como elas funcionam no seu fluxo de trabalho.
  • Participe de treinamentos internos e externos, mesmo que não sejam obrigatórios.

3. Crie um “Plano B”

Não espere a crise chegar para agir. Ela já está.
Tenha sempre alternativas mapeadas: setores correlatos, funções compatíveis e contatos-chave que possam abrir portas rapidamente.

Ação prática:

  • Atualize seu portfólio e currículo trimestralmente.
  • Cultive relacionamentos fora do seu círculo imediato.
  • Mantenha um conjunto de competências transferíveis para outros setores.
  • Trabalhe seu corpo, aparência, vocabulário, gestões e expressões. Isso traz benefícios para a saúde mental, outro importante alicerce individual.

4. Faça do Aprendizado um Hábito

O filtro da tecnologia se move junto com a inovação.
Isso significa que a única proteção real é também estar em constante movimento.
Aprender não pode ser um projeto isolado, precisa ser parte da rotina.

Ação prática:

  • Defina micro-habilidades para aprender a cada mês.
  • Busque feedback contínuo e rápido sobre seu desempenho.
  • Assuma projetos que forcem você a operar fora da sua zona de conforto.

E lembre-se: a vida não avança em uma linha reta, mas em rotas íngremes, inesperadas e surpreendentes. Positivamente ou não.

“Em períodos de mudanças abruptas e descontínuas, a essência da adaptação envolve uma sensibilidade aguçada para o que deve ser abandonado — não apenas para o que deve ser mudado ou introduzido. A disposição para se afastar do familiar tem um valor distinto para a sobrevivência.”

— Peter Drucker

Alguns conceitos clássicos, como esta citação de Drucker, assim como outras antigas formas de ver o mundo, por mais paradoxal que pareça, tornam-se cada vez mais valiosos. Em meio a tantas mudanças, cultivar o “EU SA” , sabendo adaptar-se, é essencial. E, quando necessário, não hesite: vire a própria mesa antes que alguém o faça por você.

E não esqueça: visão de mundo. Nada será tão importante quanto a sua percepção de negócios, relacionamentos e tecnologia.

Fontes: 

Conteúdo baseado em ideias de Peter Drucker, nas quais o autor defende o conceito de planned abandonment (“abandono planejado”) como fundamento para a inovação e adaptação em períodos de mudança.

O título citado no editorial da edição nº 131 na nossa newsletter quinzenal Inspire, faz alusão ao livro “Virando a Própria Mesa”, de Ricardo Semler (1988), que aborda a importância de romper modelos tradicionais e assumir o protagonismo na transformação organizacional.

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